Palavras-chave: Gerador de imãs permanentes, máquina síncrona, pequena central elétrica, geração distribuída, imã de neodímio, imã de ferrite de estrôncio.

Resumo:

 

Projetar, fabricar e ensaiar um gerador de imãs permanentes de 40KW em 600RPM, utilizando uma concepção inversa ao tradicional para geradores síncronos, com rotor girando sobre o estator e empregando imãs retangulares empilhados para formar os pólos. O arranjo permite se fazer uma máquina com baixo custo, projetada para uso em torres eólicas ou para mini centrais geradoras de baixa rotação, como turbinas de Arquimedes.

 

1- Introdução

 

A tendência mundial no aumento do consumo de energia elétrica, sinaliza para a oportunidade do estabelecimento de pequenas usinas produtoras de energia elétrica limpa, impondo a necessidade de se dispor de máquinas de pequeno porte, cujo custo de fabricação seja realmente atrativo e que possibilite a implantação de usinas de geração distribuída [1]. Nesta visão de economia, este estudo apresenta o dimensionamento básico de um alternador de imãs permanentes, projetado e fabricado com materiais de fácil acesso e baixo custo, principalmente no que se refere aos imãs, carcaça e aço-silício. Estes itens são os que mais pesam na fabricação de geradores síncronos de imãs permanentes e, se tratando de simplicidade, peças usinadas devem ser reduzidas ao máximo possível, deixando apenas o realmente necessário, como eixo e assento de rolamentos. A descrição a seguir mostra como é possível a montagem de um alternador de imãs permanentes seguindo o raciocínio sobre um projeto específico de 40KW em 600RPM e 380 volts.

 

2- Máquina Síncrona

 

Uma máquina síncrona é aquela em que a rotação do rotor está amarrada a frequência aplicada aos bornes do estator quando máquina motriz ou vice-versa, quando funcionando como gerador, ou seja, a frequência está amarrada a rotação de giro do rotor [2]. Convencionalmente, uma máquina síncrona é de acordo como representado no croqui da figura 1.

 

Figura 1 - Máquina Síncrona convencional

Figura 1 – Máquina síncrona convencional

 

Neste arranjo, o estator, que compõem-se do aço-silício e do bobinado estatórico, é fixo e acomodado sobre uma carcaça de aço. Os pólos, que compõem o conjunto rotatório, formado pelos pólos, anel, magnético e eixo, que é suportado pelos mancais e acoplado a carga ou máquina primária. Nas ranhuras estatóricas do aço-silício, são instaladas convenientemente, as bobinas estatóricas, formado por cobre eletrolítico de alta pureza, em barras ou fios redondos, dependendo da potência, com uma espira ou multi espiras, dependendo da tensão, isolado com material e quantidade adequado para cada classe de isolação e nível de tensão elétrico. Cada pólo do rotor recebe uma bobina, formado por cobre eletrolítico isolado em barras ou fio redondo, dependendo da potência e classe de isolação, cuja função é fornecer o campo magnético necessário para o acoplamento com o campo magnético girante formado pela circulação de corrente nas bobinas do estator. Estas bobinas polares recebem o nome de bobinas de excitação e são alimentadas por corrente contínua que chega nelas através de um conjunto de escovas e anéis de excitação montado no eixo [2]. O número de pólos de uma máquina síncrona é sempre par e a alternância do fluxo magnético é sempre Norte-Sul entre os pólos. A figura 2 permite observar o sentido de circulação do fluxo magnético através dessa alternância. Funcionando como gerador e as bobinas dos pólos devidamente excitados pela corrente contínua, é estabelecido um fluxo magnético nos pólos que encontra caminho pelo aço-silício do estator, fechando o circuito magnético. O rotor ao girar dentro desse estator, arrasta o fluxo magnético no sentido de giro, o fluxo passa a cortar as bobinas do estator, induzindo uma FMM na fase correspondente dessas bobinas. Como o processo é mecânico, ou seja, a velocidade de corte do fluxo magnético obedece a velocidade de giro do rotor, temos uma frequência nos bornes de estator que corresponde a esta velocidade giro.

 

Figura 2 - Sentido de giro do rotor e do fluxo magnético

Figura 2 – Sentido de giro do rotor e do fluxo magnético

 

Quando a máquina funciona como motor síncrono, o acoplamento mútuo entre os campos magnéticos formados no estator e no rotor, obriga o rotor a andar em sincronismo com o campo girante agora com a frequência ditada pela tensão aplicada nos bornes do estator.

 

3- Máquina Síncrona de Imãs Permanentes

 

A máquina síncrona de imas permanentes tem exatamente o mesmo princípio de funcionamento descrito no item anterior. A diferença, é que o fluxo magnético antes produzido pelas bobinas polares (ou bobinas de excitação), agora é produzido por imãs. Este artigo tratará do estudo deste tipo de máquina mas funcionando como gerador. Os imãs devem ser capazes de suprir a demanda magnética solicitada pelo circuito magnético, mais a solicitação imposta pela carga. E, ao contrário de um gerador síncrono convencional, onde podemos controlar o campo magnético pela variação da corrente de excitação, mantendo uma tensão estável de saída, quando se usa imãs para produzir o campo magnético, não se tem controle sobre este campo, logo, não se pode variar a tensão de saída nos bornes do estator. A tensão a vazio fica livre, e assume um valor dada pela frequência gerada (que está acoplada a rotação), pois sendo o fluxo magnético fixo, temos a tensão de saída a vazio Vo dado por:

Fórmula 01

Esta fórmula clássica permite deduzirmos que um gerador de imãs permanente precisa ser dimensionado de modo que a tensão Vo apresente um valor maior e tal que quando a máquina estiver plenamente carregada, temos o afundamento da tensão para o valor nominal de projeto, já que não existe controle na excitação que possa a corrigir. Embora isso seja obvio, é importante observar que este tipo de máquina, operando em um sistema de geração, por exemplo, em uma torre eólica, em uma situação favorável de vento, a turbina pode imprimir elevada rotação ao conjunto gerador e de acordo com (1), se o gerador estiver desacoplado da carga, teremos uma elevada tensão na saída de seus bornes, podendo danificar irreversivelmente a isolação das bobinas estatóricas pelo stress elétrico imposto. Esta análise permite vermos que a tensão a vazio Vo precisa ser pré-estabelecida para dimensionamento correto do isolamento. Por outro lado, quando este gerador estiver sob carga, vai ocorrer o afundamento da tensão e Vo é influenciada por fatores adicionais na sua composição, temos então a tensão de saída Vc que fica determinada pela seguinte fórmula:

Fórmula 02

Vo é a tensão a vazio;

Xs é a reatância síncrona total na condição de carga da máquina;

Il é a corrente de linha sob carga da máquina;

Rf é a resistência ôhmica do enrolamento da máquina na temperatura de operação;

A reatância síncrona total Xs desse tipo de máquina compõe-se por duas outras reatâncias principais; a reatância de dispersão [4] [6] e a reatância provocada pela redução da magnetização frente a força contra eletromotriz da carga, ou, reatância síncrona de magnetização [3]. A primeira é tradicionalmente conhecida sendo designada normalmente por X1 e seu cálculo tem o mesmo princípio. Já a reatância de magnetização, lança mão de um cálculo gráfico para seu dimensionamento. É necessário determinar os níveis de intensidade do campo magnético a vazio e em plena carga para os imãs escolhidos. Este nível de variação permite o uso da seguinte fórmula:

Fórmula 03

Onde B é a indução no ponto de operação definido. Desse modo, podemos determinar todas as variáveis necessárias para o traçado da curva característica do gerador, até o limite onde ocorre a máxima oposição permitida ao fluxo magnético produzido pelos imãs, ou, seja em Bcarga. Portanto, a determinação dos imãs precisa levar em conta a observação de limite de tensão frente ao isolamento a usar e a capacidade de fornecer força magnética em carga, que são os dois extremos da operação. Parte-se inicialmente para a formação do gráfico a vazio da figura 3, representado para um determinado gerador usando imãs de Neodímio grade N50. Através do cálculo convencional do fluxo magnético e dos Ae necessário a manutenção do circuito magnético da máquina [6] em questão, dividimos este valor de Ae pela espessura do imã, obtendo o ponto na reta abcissa e o fluxo dividido pela área do imã, obtendo o ponto na reta ordenada [3].

Figura 3 - Curva a vazio

Figura 3 – Curva a vazio

 

A inclinação no final da curva representa o início da saturação do aço do circuito magnético. Determinando-se os Ae necessários para o gerador em funcionamento sob carga, traçamos a curva de funcionamento em carga, deslocando paralelamente esta curva em relação a curva a vazio anterior e no valor proporcional desses Ae em carga [3], como na figura 4.

Figura 4 - Curva a vazio e em carga

Figura 4 – Curva a vazio e em carga

 

A análise gráfica permite determinar se o fluxo magnético disponível nos imãs é suficiente para atingir os níveis das grandezas nominais do projeto.

 

4- Gerador Síncrono de Imãs de Ferrite de Estrôncio

 

Seguindo a metodologia descrita no item anterior, podemos montar o gerador de imãs permanentes. O estudo representa a investigação para um gerador de 40KW, 600RPM e 380V, podendo ser conectado em estrela (380V) ou delta (220V). No mercado de imãs, os imãs mais acessíveis são os compostos por ferrite. Podem ser de ferrite de bário ou ferrite de estrôncio, cujo poder magnético é um pouco superior. Este artigo trabalha fortemente na redução dos custos, sendo lançado mão de uma configuração onde o rotor fica sobre o estator, como visto na figura 5.

Figura 5 - configuração para um gerador de imas permanentes

Figura 5 – configuração para um gerador de imas permanentes

 

Esta configuração segue o que se vem descriminado – o custo. O desing adotado permite que se instale os imãs internamente no anel magnético, usando-se cola adequada. Este fato elimina a necessidade da construção de um imã especial, com furos ou arranjos para encaixes, podemos utilizar um imã liso. Este fato é extremamente importante, pois imãs retangulares e lisos são os mais baratos, logo, seu uso deve ser considerado, ainda mais em um projeto com um número elevado de componentes como este. Outro fato também já comentado no item 1, é a utilização de imãs retangulares num número suficiente para formar o pólo. Foram utilizados 12 imãs de 10mm de largura, formando um pólo com 120mm. Este arranjo precisa ser montado como na figura 6, tomando cuidado com a polaridade correta de cada imã individual, para não inverter um deles. Deste modo, elimina-se a necessidade da construção de um imã especial, com a curvatura do raio do anel magnético.

Figura 6 - Formação do polo

Figura 6 – Formação do polo

 

Os imãs de uma forma geral, seja de ferrite ou neodímio, são extremamente frágeis mecanicamente. Não permitem suportar grandes esforços diretamente sobre eles produzido, por exemplo, por parafusos de fixação. A configuração adotada aqui elimina este risco pois, sendo os imãs fixo por cola (AralditeR F, ou AralditeR 138) no lado de dentro do rotor, a força centrifuga sobre eles é desconsiderada, podendo a máquina suportar altas rotação [6], desde que o isolamento permita. O estudo teórico da máquina de acordo com (1) e com o dimensionamento adotado para a parte ativa, resulta o gráfico 1 da rotação x tensão:

Gráfico 1 - Rotação x Tensão

Gráfico 1 – Rotação x Tensão

 

O comportamento linear se observa devido à baixa indução que existe no circuito magnético, este fato de deve a pequena capacidade de fornecer fluxo magnético dos imãs de ferrite, impossibilitando a saturação do aço envolvido, diferente dos imãs de neodímio, cujo poder magnético é muito superior. Aplicando-se (2) para uma rotação constante, resulta o comportamento tensão x rotação do gráfico 2:

Gráfico 2 - Tensão x Corrente

Gráfico 2 – Tensão x Corrente

 

Nota-se no gráfico, a tensão em declínio com o aumento da carga, desde a tensão a vazio até plena carga.

 

5- Implantação Prática

 

O estudo levou a implantação do gerador síncrono de imãs de ferrite de estrôncio de 40KW, 600RPM e 380V. O aço-silício utilizado foi de 0,5mm de espessura, com isolamento em ambas as faces. Este aço foi cortado em laser em três segmentos para formar uma circunferência. Devidamente empilhado e prensado na carcaça. A carcaça é auto sustentante, construída de chapas de aço ASTM A36 cortados em laser com 6,35 a 12,7mm, soldada e no centro foi instalado o cubo com rolamentos para suportar o rotor. Sendo esta peça, o eixo e o anel magnético as únicas que receberam usinagem. O corte laser apresenta tolerância suficiente para dispensar qualquer outra usinagem, desde que as peças sejam projetadas para se encaixarem antes da soldagem final. Na figura 7 vemos a montagem do rotor com os imãs devidamente instalados.

Figura 7 - Rotor com os imãs Hidroenergia

Figura 7 – Rotor com os imãs Hidroenergia

 

O estator foi bobinado com fio de cobre eletrolítico redondo esmaltado. O isolamento das ranhuras, entre camadas e cabeceiras das bobinas é a base de filme de poliéster. Na figura 8, o estator está pronto para impregnação com verniz isolante.

Figura 8 - Estator bobinado Hidroenergia

Figura 8 – Estator bobinado Hidroenergia

 

Após a montagem da máquina, executou-se uma bateria de testes estáticos como resistência de isolamento e resistência ôhmica do estator. Na figura 9, vemos o gerador pronto para execução dos testes elétricos em giro.

Figura 9 - máquina pronta para ensaio - Hidroenergia

Figura 9 – máquina pronta para ensaio – Hidroenergia

 

Acionando o gerador de imãs permanentes, conectado em delta, através do uso de um motor de indução e um inversor de frequência, levou-se a rotação de zero a 600RPM. O comportamento da tensão a vazio de fase teve o resultado do gráfico 3.

Gráfico 3 - subida da tensão

Gráfico 3 – Subida da tensão

 

O comportamento da máquina sob carga em rotação nominal de 600RPM, está representado no gráfico 4. O gerador foi levado a rotação nominal e conectado bancos de carga resistiva. A elevação da corrente estatórica impõe um rápido afundamento da tensão. O teste foi realizado até 30A de fase, sendo impossível a continuação por motivos de falta de potência da máquina primária, a qual começou a reduzir a rotação do ensaio.

Gráfico 4 - Comportamento tensão x carga

Gráfico 4 – Comportamento tensão x carga

 

6- Conclusão

 

O artigo mostrou a ideia da implantação prática de um gerador de imãs permanentes de ferrite de estrôncio e um desing que permite o uso de materiais e recursos de baixo custo. O principal objetivo, é agregar mais um recurso para ajudar a tornar viável o uso desse tipo de máquina no aproveitamento de pequenos potenciais primários na conversão de energia elétrica para geração distribuída. O gerador apresentado teve um desenvolvimento teórico enxuto, cujos resultados práticos, ao serem confrontados com o cálculo, mostram bastante proximidade. Mas numa análise mais precisa, podemos ver os desvios, principalmente na subida de tenção em vazio. Embora seja realmente linear, pelo fato de a saturação magnética não ser alcançada até a tensão nominal (a 600RPM), a tensão mostrou-se cerca de 8% menor que a calculada. Teoricamente, de acordo com o descrito no item 2, deveríamos ter uma tensão de 230V de fase nos terminas da máquina. Isto permitiria o afundamento em carga para os níveis nominais. No resultado prático obtemos 213V. Conclui-se imediatamente que ao aplicarmos a fórmula (1), de onde se calcula a tensão a vazio, desprezou-se as perdas magnéticas e perdas no ferro [7], principalmente as dispersões existentes nos pólos. Sendo a energia magnética fornecida pelos imãs, parte dessa energia, mesmo a vazio, deve suprir tais perdas. Esta dispersão parece ter maior efeito devida ao pólos serem compostos por vários imãs agrupados, impondo inúmeros entreferros entre o anel magnético e os próprios imãs. Logo, o fluxo magnético era menor que o calculado. Deve-se trabalhar com (1), mas efetuar um estudo mais profundo para aplicar a fórmula (3), que determina a queda da magnetização, nessa fórmula (1) também. Isto se vê no comportamento em carga, que teve tendência ao resultado dado pela fórmula (2), que determina a tensão sob carga onde, estre as demais, a quedas por dispersão (que formam Xs) são muito consideráveis. A tensão em carga de 30A, que foi o limite prático do ensaio, é de 192V. No gráfico teórico 2, para 30A teríamos cerca de 200V, caso fosse considerado uma redução de 8% na tensão a vazio. Já no gráfico pratico 4, medimos 192V para mesma situação retratada. A análise, permite ver que não seria possível atingir 40KW finais como desejado com esta máquina. Na condição prática permitida do ensaio, seria esperado 19,8KW e foram medidos 17,3KW, uma diferença de 14,5%. A metodologia do ensaio permitiu ver que a força magnética fornecida pelos imãs resultou insuficiente, necessitando de refinamentos no cálculo teórico. No entanto, permitiu-se ver ainda que, embora a máquina possa ter uma aplicação prática satisfatória, seria necessário o desenvolvimento de novo protótipo, utilizando imãs maiores e o estudo da possibilidade da redução do entreferro, onde ocorre a solicitação da maior parte dos Ae do circuito magnético.

 

Referências

 

[1] ANEEL; Resolução Normativa ANEEL nº 482/2012.

[2] Kostenko, M; Piotrovski, L. “Máquinas Eléctricas”. Moscou. 1979.

[3] Mathiazzi, André Camargo. “Análise da Variação da Tensão Gerada e do Estado de Magnetização em um Gerador com Imãs Permanentes”. São Paulo. Dissertação de Mestrado. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. 2007.

[4] Say, M.G. “The Performance and Desing of Alternating Current Machines”. Pitman Paperbacks. Londres. 1958.

[5] Königslöw, A. von; “Máquinas de Corrente Alternada Sincrónicas”. Escola Técnica de Mittweida. 1945.

[6] Abramov, A. H; “Projeto e Construção de Hidrogeradores”. Moscou. 1964.

[7] Jordão, Rubens Guedes. “Máquinas Síncronas”. LTC/EDU. SP. 1980.